domingo, 1 de julio de 2007

Um grande músico desconhecido, Joseph de Saint-George, chamado "O Mozart preto"



Hoje vou deixar aqui uma postagem sobre um grande músico preto, Joseph de Bologne, conhecido como Chevalier de Saint-George. (A música que se está a ouvir é um trecho do quarteto de cordas escrito por este grande músico). Espero ter despertado a vossa curiosidade sobre este personagem e que tenham vontade de descobrir a sua música.

Saint-George (1745 – 1799) foi uma personalidade fora do comum no mundo da música clássica. Foi um músico e compositor de talento, um dos melhores esgrimistas de Europa e um coronel heróico da Revolução Francesa.
Joseph, era filho de George de Bologne de Saint-George, um rico fazendeiro das Antilhas e de Anne, uma jovem escrava de 17 anos nascida na ilha de Gaudeloupe.
O pai de Joseph dá-lhe uma educação digna de qualquer filho de fidalgo. Ensina-lhe música e esgrima.
Em 1753 a família volta para França onde o pai toma posse do cargo de gentil-homem da câmara do rei.
Em 1756 Joseph é admitido na academia de esgrima, um colégio de elite, onde os alunos assistem a cursos de matemáticas, história, línguas, música, desenho e dança. Sempre com o problema cada ano de não voltar a ser admitido, devido ao racismo que impera em França.
Foi graças às influências do pai, que Joseph pode continuar os seus estudos e também entrar na Academia Real de Música do Rei.
Em 1776, tem que abandonar a academia, onde o designaram director, devido a uma petição de umas cantoras que diziam que "A sua honra e a delicadeza da sua consciência não lhes permitiam estar submetidas às ordens de um mulato".
Esta petição põe fim às aspirações de Saint-George para ser director desta grande instituição, a mais prestigiosa de França.

Entre tanto novas medidas raciais são tomadas em França, chegando-se a proibir os casamentos inter-raciais.

Saint-George vai ser chamado para dirigir o teatro da marquesa de Montesson, esposa de Louis Philippe, duque d'Orléans.
Aí representa a sua primeira comédia musical, Ernestine, para a qual só escreve a música.
Ao longo da sua vida compõe uma sonata para flauta e harpa, várias sinfonias, concertos para violino e quartetos para cordas. Ele e Gossec estão entre os melhores compositores franceses de quartetos para cordas.

Algumas vezes deu-se a este músico o nome de "Mozart preto", um nome que rechaça Dominique René de Lerma, especialista das obras de Joseph de Bologne e professor no departamento de música da Lawrence University, Wisconsin.
"Porque não fazer total abstracção das considerações sobre a cor da pele? Devido que Saint Georges teve uma influência sobre a música de Mozart, e porque não se chamou o Mozart o "Saint-George Branco?".

Na Revolução francesa, permitem-lhe conduzir uma brigada de africanos, conhecida como a Legião Saint-George.
Um dos chefes de esquadrão desta companhia ia ilustrar-se mais tarde nos exércitos da Revolução: Alexandre Dumas, cujo filho foi o célebre escritor e autor dos "Três Mosqueteiros". O pai, o General Dumas, nascido em Jérémie na ilha de Saint Dominique, como Saint George, era filho de uma escrava preta, Césette Dumas e de um nobre arruinado, o marquês de Davy de la Pailleterie, proprietário de uma modesta fazenda.

RACISMO E ESCRAVIDÃO

Voltaire, filósofo do "Século das Luzes" escrevia: "Os africanos e os seus descendentes são geneticamente inferiores aos europeus brancos".
Noutro momento, depois da representação da Ópera "La fille du Garçon", a maioria dos jornais incensam Saint-George e a sua música e não a letra de Antoine Eve. O barão Melchior, influenciado pelas ideias racistas de Voltaire põe em dúvida o talento inovador de Joseph, dizendo que "toca bastante bem o violino, mas não tem espírito criativo, já que seria contrário à natureza que o tivesse. Esta obra é certamente a melhor do Sr. Saint-George, mas também aparece desprovida de invenção. Isto recorda uma observação que ainda não se pode desmentir, e é que se a natureza serviu de um modo particular os mulatos dando-lhes uma grande capacidade para exercer todas as artes de imitação, não lhes deu esse ímpeto do sentimento e do talento que produz ideias novas e criações originais".

A Convenção abole a escravatura nas colónias francesas em 1794.
O ideal de igualdade para o qual Saint-George e os seus voluntários pretos combateram é rapidamente ignorado. Napoleão Bonaparte envia as suas tropas a Guadeloupe e Saint Domingue para restabelecer a escravidão.
Todos os que se consideravam como homens livres sublevam-se, mas a 28 de Maio de 1802 são vencidos e executados.
A abolição da escravidão só será efectiva em 1848.
No entanto, os africanos que vivem em França são descriminados. A 29 de Maio um decreto oficial afasta todos os oficiais pretos e mulatos do exército, o que põe fim à brilhante carreira do general Alexandre Dumas.

É de deplorar que os "manuais de história" digam tão pouco do Chevalier de Saint-George ou do milhão de escravos deportados para as Antilhas francesas, enquanto o Sr. Voltaire é honrado como um dos mais brilhantes humanistas e Napoleão como o mais glorioso homem de Estado.

Saint-George foi ainda o primeiro franco-mação preto de França, iniciado na loja do Grande Oriente de França "Loja das Nove Irmãs".

26 comentarios:

avelaneiraflorida dijo...

Obrigado, querida Ema!!!!!!!!

Este post foi muito importante para mim!!!
Gosto de música, gosto de muitas coisas, mas tenho muito a aprender...

Que bom ter encontrado alguém que gosta de coisas tão importantes, e, sobretudo, se disponibiliza a partilhá-las...

Ema Pires dijo...

Querida Avelaneira,
Espero que descobra a música do Saint-Georges, é algo muito especial. Pode encontrar discos em Amazone ou na FNAC, pela Internet.
Imagino que por ser preto, nao se lhe deu toda a importância que tinha e ontinua a ter. Está a ser descoberto em França. Eu tenho um especial carinho por ele porque viveu numa época onde imperava o racismo mais encarniçado. E já é tempo de revelar também que o Voltaire, o grande humanista do século das luzes foi imensamente racista.
Beijinhos

avelaneiraflorida dijo...

Foi isso precisamente que aprendi AQUI!!!!

Vou ter o maior gosto em descobrir este novo músico!!!!!

E os meus próximos BESOUROS vão ouvir e falar dele, GARANTO!!!!!

Já é Tempo de AS LUZES ...serem reveladas!!!!

"Brigados" mais uma vez!!!!!
Bjks

Ema Pires dijo...

Exactamente querida amiga. Alguma vez quando falei deste tema com algum "erudito", quase me queima por herege. Mas aí estao os textos, nao estou a inventar nada. O Voltaire tinha também a sua parte escura. Mas sao desses personagens históricos que nao se podem tocar, nem dizer verdades que estorvam!
Beijinhos

Tía Doc.- dijo...

Antes que nada, quiero pedir disculpas, por no escribir mi comentario en portugués... es que no sé hacerlo. Entiendo el idioma leyendo y escuchando, pero escribir... a ver si el año que viene aprendo.
Ema:
Me encantó el post, con la música (buenísima) de fondo, es como trasladarse a aquellas épocas... y mientras leia las odiseas de Saint-George, pensaba en qué poco ha cambiado el mundo..., la discriminación de las personas por su color, idioma, país de origen. Todo basado en la ignorancia de esos "otros". Pero hasta estos días sucede que cuando alguien es bueno, ya no importa de dónde haya salido, quién tiene dinero y poder se apodera... no sé, como trabajo con temas interculturales, es inevitable que piense en esas cosas, porque me gusta mucho el tema.
Gracias por el viaje al pasado y por la música presente.
Un abrazo.

Joaquim Moedas Duarte dijo...

Vim aqui, assisti à vossa conversa e subscrevo. Subretudo as palavras da minha amiga Avelã. Também me senti a aprender coisas novas e agradeço o que nos traz. vai para a fila das coisas a aprofundar...
Saudações!
E obrigado pela sua visita.

Ema Pires dijo...

Hola amiga,
No hay ningñun problema en escribir en castellano. Todos comprendemos. Por otra parte, mi blog es multicultural y... multilíngue!
Pues la realidad es esa, hubo una epoca en que parecía que el racismo estaba remitiendo, pero ultimamente hay como una recrudecencia de la intolerancia hacia el que es diferente color o tiene otra cultura. Yo misma, y eso que soy de piel clara, he sufrido del racismo por mis orígenes. Por eso quiero en este blog hablar de los grandes hombres y mujeres de África, eternamente olvidados por la historia.
Un gran abrazo querida amiga y vuelva siempre.

Ema Pires dijo...

Amigo meón,
Alegro-me que tenha servido para o ilustrar sobre esté compositor cuja música encontro cheia de sentimento e o reflecto de uma alma nobre.
Um abraço

Anónimo dijo...

Gracias Ema por darme a conocer a este magnifico compositor , esgrimista y militar . La cultura debe prevalecer , nos hace poder participar en la vida con una vision diferente y hablar con propiedad .
Besos
antoine de la france

papagueno dijo...

Incrível como naquela época e naquela sociedade chegou onde chegou, mesmo sendo filho de um homem poderoso. Gostei muito da música e vou ver se encontro mais coisas por aí.
Viver e aprender, não conhecia esta faceta racista do Voltaire.
Obrigado por este excelente post.
Jinhos

A. João Soares dijo...

Cara Ema,
Desculpe introduzir aqui uma sugestão alheia a este seu lindo post e espero que dê a sua adesão:

Está a ter grande adesão a petição de apoio à causa do Professor António Caldeira do Blogue "Do Portugal Profundo". Como estou solidário com a sua causa e contra mais esta tentativa de amedrontar quem tem a coragem de falar claro e dizer aquilo que pensa, divulgo em «Do Miradouro» esta mensagem com o link para a petição. Todos os que o desejarem podem copiá-la e utilizá-la. Importante mesmo é que nos lembremos que esta luta do Professor Caldeira, é uma luta por todos nós e que tem também de ser de todos nós, pela liberdade que desejamos e pela verdade a que temos direito.
Abraço

Ema Pires dijo...

Amigo Papagueno,
Pois é assim, o Sr. François Marie Arouet, (Voltaire), citado em todas as enciclopedias como grande defensor dos Direitos Humanos, tinha a sua parte racista. Para ele os pretos nao tinham direitos porque eram como uns "sub-homens". Mas seria bom que as pessoas se informassem sobre a sua verdadeira biografia e nao só do que dizem as enciclopedias. De todos modos nao foi uma pessoa muito querida no seu tempo e teve que fugir para Suiça onde viveu os seus últimos dias, se nao me falha a memória.
Beijinhos

Ema Pires dijo...

Hola Antoine de la France,
Hace mucho que no te veo por aquí. Bienvenido. Espero que sigas honrándome con tus gratas visitas.
Un beso

Ema Pires dijo...

Amigo Joao Soares,
Já assinei a petiçao. Estou consigo nesta luta de sempre contra a liberdade de expressao. Pensava que isto só passava nos países com regimes totalitários, mas estou a ver que em Portugal, um país da CE também está a passar.
Um grande abraço e coragem. E o Sr. Socrates é agora presidente da CE!!!!

Gasolina dijo...

Ema,

(parece que o comment que ontem deixei aqui, esfumou-se...)
Tenho pena, pois era uma louvável apreciação sobre o teu trabalho didáctico.
De qq maneira, confirmo: estás de parabéns.

Besitos.

Ema Pires dijo...

Amiga gasolina,
A informática é algo maravilhoso mas às vezes parece coisa de bruxas! Efectivamente deve-se ter esfumado pelas vias infinitas da blogosfera. Uma pena, sempre é motivo para mim de alegria ler os seus comentários.
Beijinhos

Ema Pires dijo...

Muito obrigada pelos parabéns. Nao me dá a impressao de merecer tanto. Só sao pequenas coisas que quero partilhar, nomeadamente sobre África e os africanos. Por outra parte, intento nao falar de tristezas nem de desgraças, que para isso já está a imprensa.
Um grande abraço para ti amiga Gasolina.

Gasolina dijo...

Um beijo para ti Ema das Danças.

Joana DÁrc dijo...

Ola Ema, ainda nao tinha lido esta do compositor Saint-George. Eu já tinha lido, não sei onde, esta historia e desde essa altura fiquei fascinada.
senti no teu comentario no meu blogue muito desapontamento emagoa no coração. Amiga, nao te deixes abater porque nada nem ninguem o merece.
Quando estiveres para vir para portugal diz para irmos comer o nosso pastel de nata e conhecermos uma a outra. É em Juho não é?

Beijinhos

ANTONIO DELGADO dijo...

Já conhecia o autor poque tu há muito tempo passas-te-me a informação. É interessante divulgar não só este autor, mas sobretudo revelar esse ponto de voltaire que tocas-te e é menos conhecido...para alguns!

Ema Pires dijo...

Merci Antonio. Sim há tempo tinha-te falado deste músico que descobri num programa do canal ARTE, em França. Já era tempo de se falar nele e de encontrar discografia das suas maravilhosas obras.
Bisous

Ema Pires dijo...

Querida amiga Joana d'arc,
Posso aperceber-me do seu coraçao sensível. Agradeço mesmo o seu comentário e também lhe digo o mesmo; e ninguém merece uma lágrima de mulher.
Um grande abraço querida amiga.

pura eu dijo...

Olá, Ema!
Gostei muito do seu blog, e fiquei muito curiosa com relação ao seu pai... pelo facto dele ser da mesma ilha que eu. Conheces Cabo Verde? Continua com esse trabalho muito singular.

Abraços foguenses

Ema Pires dijo...

Amiga Foguense,
Vai ver que acabamos por sermos primas. O meu avô era Henrique Pires "Togom", também avô do Dr. Pedro Pires.
Na ilha do Fogo tenho muitissmos primos e primas porque a família do meu pai é toda de aí. Tenho acerteza que conhece algum. É uma gente maravilhosa como em geral todo o povo de Cabo Verde. Acolhedores, amáveis e alegres.
Pois fico mesmo contente de a ter encontrado; isto da blogosfera é um milagro. Já fui visitar o seu blogue e vou-o "linkar" no meu, se me permite.
Beijinhos

pura eu dijo...

Querida, Ema!

Claro que podes me linkar, vou fazer o mesmo com o teu blog. Conheceço os familiares do teu pai, claro! É uma família grande. Muitos primos... E Tongom é perto de Lagariça, a localidade de um dos meus avôs.

Um beijo, bem foguense, claro.

Margarida

Ema Pires dijo...

É o que digo,vais ver que no final, somos primas. Beleza!
Sabes que gosto muito do teu blogue. Está feito com muito gosto e émuito interessante. Hoje vou ver se ponho um post sobre a Ilha di Fogo, a terra dos nossos antepassados.
Bejinhos para ti