
Hoje vou deixar aqui uma postagem sobre um grande músico preto, Joseph de Bologne, conhecido como Chevalier de Saint-George. (A música que se está a ouvir é um trecho do quarteto de cordas escrito por este grande músico). Espero ter despertado a vossa curiosidade sobre este personagem e que tenham vontade de descobrir a sua música.
Saint-George (1745 – 1799) foi uma personalidade fora do comum no mundo da música clássica. Foi um músico e compositor de talento, um dos melhores esgrimistas de Europa e um coronel heróico da Revolução Francesa.
Joseph, era filho de George de Bologne de Saint-George, um rico fazendeiro das Antilhas e de Anne, uma jovem escrava de 17 anos nascida na ilha de Gaudeloupe.
O pai de Joseph dá-lhe uma educação digna de qualquer filho de fidalgo. Ensina-lhe música e esgrima.
Em 1753 a família volta para França onde o pai toma posse do cargo de gentil-homem da câmara do rei.
Em 1756 Joseph é admitido na academia de esgrima, um colégio de elite, onde os alunos assistem a cursos de matemáticas, história, línguas, música, desenho e dança. Sempre com o problema cada ano de não voltar a ser admitido, devido ao racismo que impera em França.
Foi graças às influências do pai, que Joseph pode continuar os seus estudos e também entrar na Academia Real de Música do Rei.
Em 1776, tem que abandonar a academia, onde o designaram director, devido a uma petição de umas cantoras que diziam que "A sua honra e a delicadeza da sua consciência não lhes permitiam estar submetidas às ordens de um mulato".
Esta petição põe fim às aspirações de Saint-George para ser director desta grande instituição, a mais prestigiosa de França.
Entre tanto novas medidas raciais são tomadas em França, chegando-se a proibir os casamentos inter-raciais.
Saint-George vai ser chamado para dirigir o teatro da marquesa de Montesson, esposa de Louis Philippe, duque d'Orléans.
Aí representa a sua primeira comédia musical, Ernestine, para a qual só escreve a música.
Ao longo da sua vida compõe uma sonata para flauta e harpa, várias sinfonias, concertos para violino e quartetos para cordas. Ele e Gossec estão entre os melhores compositores franceses de quartetos para cordas.
Algumas vezes deu-se a este músico o nome de "Mozart preto", um nome que rechaça Dominique René de Lerma, especialista das obras de Joseph de Bologne e professor no departamento de música da Lawrence University, Wisconsin.
"Porque não fazer total abstracção das considerações sobre a cor da pele? Devido que Saint Georges teve uma influência sobre a música de Mozart, e porque não se chamou o Mozart o "Saint-George Branco?".
Na Revolução francesa, permitem-lhe conduzir uma brigada de africanos, conhecida como a Legião Saint-George.
Um dos chefes de esquadrão desta companhia ia ilustrar-se mais tarde nos exércitos da Revolução: Alexandre Dumas, cujo filho foi o célebre escritor e autor dos "Três Mosqueteiros". O pai, o General Dumas, nascido em Jérémie na ilha de Saint Dominique, como Saint George, era filho de uma escrava preta, Césette Dumas e de um nobre arruinado, o marquês de Davy de la Pailleterie, proprietário de uma modesta fazenda.
RACISMO E ESCRAVIDÃO
Voltaire, filósofo do "Século das Luzes" escrevia: "Os africanos e os seus descendentes são geneticamente inferiores aos europeus brancos".
Noutro momento, depois da representação da Ópera "La fille du Garçon", a maioria dos jornais incensam Saint-George e a sua música e não a letra de Antoine Eve. O barão Melchior, influenciado pelas ideias racistas de Voltaire põe em dúvida o talento inovador de Joseph, dizendo que "toca bastante bem o violino, mas não tem espírito criativo, já que seria contrário à natureza que o tivesse. Esta obra é certamente a melhor do Sr. Saint-George, mas também aparece desprovida de invenção. Isto recorda uma observação que ainda não se pode desmentir, e é que se a natureza serviu de um modo particular os mulatos dando-lhes uma grande capacidade para exercer todas as artes de imitação, não lhes deu esse ímpeto do sentimento e do talento que produz ideias novas e criações originais".
A Convenção abole a escravatura nas colónias francesas em 1794.
O ideal de igualdade para o qual Saint-George e os seus voluntários pretos combateram é rapidamente ignorado. Napoleão Bonaparte envia as suas tropas a Guadeloupe e Saint Domingue para restabelecer a escravidão.
Todos os que se consideravam como homens livres sublevam-se, mas a 28 de Maio de 1802 são vencidos e executados.
A abolição da escravidão só será efectiva em 1848.
No entanto, os africanos que vivem em França são descriminados. A 29 de Maio um decreto oficial afasta todos os oficiais pretos e mulatos do exército, o que põe fim à brilhante carreira do general Alexandre Dumas.
É de deplorar que os "manuais de história" digam tão pouco do Chevalier de Saint-George ou do milhão de escravos deportados para as Antilhas francesas, enquanto o Sr. Voltaire é honrado como um dos mais brilhantes humanistas e Napoleão como o mais glorioso homem de Estado.
Saint-George foi ainda o primeiro franco-mação preto de França, iniciado na loja do Grande Oriente de França "Loja das Nove Irmãs".